ENTREVISTA COM O PRESIDENTE DO CNLB, LAUDELINO AUGUSTO SOBRE AS ELEIÇÕES - 2012

O presidente do Conselho Nacional do Laicato do Brasil (CNLB), Laudelino Augusto dos Santos Azevedo, concede entrevista exclusiva ao Jornal Santuário de Aparecida. Ele fala sobre as eleições 2012.

Jornal Santuário – As eleições municipais trazem os temas para mais perto do dia a dia da população. O envolvimento consciente no pleito pode auxiliar na construção de uma democracia que não seja apenas representativa (modelo atual), mas também participativa (nova estrutura)? Quais são as principais diferenças entre esses dois modelos, com suas perdas e ganhos?(...)

Laudelino Augusto dos Santos Azevedo – De fato, as “coisas” acontecem é no município e o momento eleitoral é privilegiado para a conscientização e consequente mudança de mentalidades e estruturas. A participação consciente das pessoas é condição para a conquista da cidadania e consequente efetivação da democracia, que, no desenvolvimento do processo, vai deixando de ser simplesmente representativa e se tornando cada vez mais participativa.

Os dois modelos são complementares na medida em que a representatividade for autêntica, ou seja, a pessoa eleita “representa” e não somente “substitui” o povo. Os dois modelos vão coexistir sempre. As perdas acontecem quando os “representantes” sobrepõem interesses pessoais ou de grupos aos interesses da coletividade e os ganhos se dão sempre que a representatividade for autêntica.

JS – Fala-se muito em “votar bem”, “usar bem o voto”. Quais seriam os principais pontos a que as pessoas devem atentar para concretizar esse objetivo?

Laudelino – O Documento 42 da CNBB afirma que a participação do povo “poderá expressar-se de modo privilegiado no momento das eleições, através do voto consciente e responsável”. Para garantir a qualidade do voto, é preciso conhecer a história dos candidatos(as), o programa que apresentam, a maneira como fazem a propaganda eleitoral, se gastam muito dinheiro, quem os financia, votar com liberdade, sem pressões, lembrando-se que “voto não tem preço, tem consequências”. Toda esta análise deve ser feita em comunidade, nunca isoladamente.

JS – O tema da reforma política é volta e meia retomado no espaço público, mas o Parlamento não tem grande interesse em debater o tema. Quais seriam os principais pontos do modelo atual que precisariam de uma reforma?

Laudelino – O Documento 91 da CNBB – Por uma Reforma do Estado com Participação Democrática – vai mais além do que uma simples reforma política e,muito menos apenas eleitoral, como andam fazendo. A V Semana Social Brasileira, em andamento, aprofunda e questiona: “Estado, para que e para quem?”

É isso mesmo, é urgente uma reforma profunda, estrutural. A começar da concepção de “poder”, das estruturas tão onerosas e pouco eficientes da “máquina” pública dos chamados Três Poderes e da representatividade, incluindo o processo eleitoral. Exorto os leitores a participarem da Semana Social e contribuirem para uma autêntica reforma do Estado Brasileiro.

JS – O Papa Paulo VI afirmou certa vez que “a política é uma maneira de viver o compromisso cristão ao serviço dos outros”. Para o cristão, qual é o significado de participar do processo político?

Laudelino – Paulo VI foi mais além, afirmando que “a Política é a mais perfeita forma de vivermos o Mandamento do Amor”. E nossos Pastores afirmam em Puebla que “A Política é uma mediação privilegiada da caridade e a fé cristã a valoriza e a tem em alta estima” (P 514). O Documento sobre o Apostolado dos Leigos do Concílio Ecumênico Vaticano II nos ensina que “O cristão na Política abre caminho para o Evangelho” (AA 14) Portanto, este é o significado do cristão participar do processo político : abrir caminho para que o Evangelho, a Boa Nova da vida em abundância, a educação, a saúde, a moradia digna, o trabalho e o salário justo, o lazer, a segurança, a cidadania sejam assegurados para todos. O Documento Catequese Renovada também afirma: “O cristão, como cidadão do mundo, tem uma missão irrenunciável nas diversas instituições do mundo social e político para que aí se realize o Reino de Deus” (26, 300).

JS – Votar não basta, mas é preciso também acompanhar a atuação daqueles em que depositamos nossa representação. De que forma essa realidade pode se tornar também uma forma de expressão da fé?

Laudelino – O Documento 62 da CNBB – Missão e Ministérios dos Cristãos Leigos e Leigas – ensina que, “além da saudável e necessária participação de cristãos na política partidária, é necessário incrementar os grupos de reflexão e de acompanhamento das atividades políticas, exercendo cada vez mais a aproximação entre o compromisso de fé e o exercício da justiça por meio dos organismos de representação popular” (62, 132) Daí a importância de participar dos Conselhos de Políticas Públicas, dos Grupos de Acompanhamento ao Legislativo, das Audiências Públicas, do Orçamento Participativo, das Conferências, etc. Estas e outras são ferramentas de construção da sociedade justa e solidária, sinal do Reino de Deus; portanto, são expressões de fé consciente e madura.

JS – A atual estrutura de Estado e da própria democracia encontra-se em crise, ou seja, suas estruturas já não conseguem responder aos questionamentos, demandas e ânsias da população. Pode-se dizer que boa parte dessa “culpa” deve-se aos escândalos que recorrentemente assolam o campo político. Como fazer para levar a um reencantamento com a política? De que forma a Doutrina Social da Igreja pode iluminar o agir cristão para se chegar a esse intento?

Laudelino – Neste campo, temos que reconhecer que nós cristãos estamos devendo e muito para a nação brasileira. O campo político está apodrecido devido à ausência do “sal, luz e fermento” que nós cristãos devíamos ser. O Documento 50 da CNBB – Ética, Pessoa e Sociedade – constata : ” Se existe, hoje, um descrédito da atividade política e da administração pública em todos os níveis (federal, estadual e municipal), é que há maus políticos. Eles são os maiores responsáveis pelas imoralidades que acabam por desmoralizar a política. Importa, pois, encorajar os políticos bem intencionados para que atuem como fermento de uma “nova prática política” (50, 137).

Para que haja um reencantamento com a política, e é o que já está acontecendo em alguns lugares, é preciso trabalhar a concepção de “política”, sua relação a partir do compromisso da fé, sempre em comunidade e na prática cotidiana. A Doutrina Social da Igreja, que “é o ensinamento do Magistério em matéria social e contém princípios, critérios e orientações para a atuação do cristão na tarefa de transformar o mundo segundo o projeto de Deus” (Santo Domingo 158), nos ensina, prepara e incentiva para, em comunidade, atuarmos concretamente.

JS – Quais seriam os principais critérios para que um político cristão possa ter uma atuação fundamentada nos valores evangélicos?

Laudelino – Participar de uma Comunidade, ter um grupo de reflexão e ação, aprofundar a Doutrina Social, conhecer e aplicar os Documentos da Igreja, tudo, é claro, a partir da mística e da vivência do Evangelho. Ter um Conselho Político que não só o acompanhe, mas participe das decisões e encaminhamentos é , também, fundamental.

Fonte: Site do CNLB

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