Os ministérios não ordenados ou os ministérios confiados aos leigos e leigas são essenciais para uma Igreja que necessita responder aos apelos do Espírito neste século que se inicia. Novas perguntas, novos questionamentos, novas estruturas de pensamento, novas visões de mundo exigem novas estruturas eclesiais, novos ministérios e serviços, evidentemente na mesma base ou na mesma essência bi-milenar. O cristianismo não é mais poder determinante nem a única oferta de explicação do mundo e da história. Há hoje uma multiplicidade de ofertas de símbolos dentre os quais os cristãos se localizam(...)
Lembremo-nos das palavras dos bispos brasileiros no documento “Missão e Ministérios dos Cristãos Leigos e Leigas”: “Na verdade – no tocante aos ministérios eclesiais –a Igreja, atenta às indicações do Espírito Santo, em função de suas necessidades internas e dos desafios da missão no mundo, vai se estruturando e organizando. [...] a Igreja, fiel a Cristo e guiada pelo Espírito Santo, não deveria ter medo de aceitar e criar novos modelos, satisfazendo assim às exigências de sua vida e missão nos diversificados contextos em que atua.” Qualquer estudo da Igreja na época pré-constantiniana, notadamente nos primeiros 150 anos, vê tal realidade. Aliás, num primeiro momento, antes do que se denominou depois de “a grande Igreja”, as diversas comunidades encontram propostas diferentes, no que diz respeito aos serviços e ministérios, aos problemas que se apresentam. Os estudos são tantos que podemos considerar o assunto como conhecido.
A Igreja vai se constituindo a partir das exigências da missão à qual foi impulsionada pelo Espírito em Pentecostes. E vai respondendo de formas nem sempre similares aos problemas que vão surgindo, tanto nas diferenças espaciais como culturais. A Igreja em Roma vai assumindo um rosto ministerial enquanto a Igreja em Antioquia assume outro. Sabemos que Paulo é enviado com Barnabé pelos presbíteros que estão à frente daquela Igreja (citar Atos e o livro em que isso é analisado). E isto sem dizer do imenso trabalho que têm os Padres da Igreja em seu diálogo com a cultura letrada da época e que influenciava o caldo cultural em que viviam os povos sob o Império Romano. Nada há de hebraico do credo niceno-constantinopolitano. É tudo grego! Afinal, qual a cultura dominante? Como falar da Encarnação sem responder aos questionamentos que o pensamento grego dominante fazia e que influenciava até o que podemos chamar de homem comum?
Mais que isso, é sensível para o que nos importa aqui o debate entre os de Tiago e os de Paulo. Imaginemos, apenas como método de pesquisa, se Pedro, mediando o embate de idéias desse a última palavra a Tiago e proibisse os de Paulo de continuarem o seu diálogo construído em praticas com os não judeus. Não seria de todo errado respondermos a essa pergunta imaginada com outra resposta também imaginada: a Igreja desapareceria como desapareceu a comunidade de Jerusalém depois das Guerras Judaicas, ou seria um grupo, uma diminuta seita de algumas dezenas de participantes.
Muito significativa é a parte dos Atos dos Apóstolos narrando o discurso de Pedro depois do Pentecostes : ele falava em aramaico e os que o ouviam o faziam em sua própria língua. Em verdade, a Palavra se encarna, sempre, no caldo cultural, do qual a língua é apenas um indicativo. E ao se encarnar, ela o faz com estruturas que digam algo para os homens e mulheres que são ou serão alcançados pela Boa Nova. Senão, eles e elas não entenderão aquela mensagem como boa nova.
2. Não calar o Espírito
Aparecida é corajosa em olhar a realidade da América Latina e do Caribe onde vê “uma realidade marcada por grandes mudanças que afetam profundamente” a sua vida. E afirmam sentirem-se desafiados “a discernir os sinais dos tempos” à luz do Espírito Santo” e o fazem como discípulos de Jesus Cristo. E estes são os pontos de partida de todos aqueles e aquelas que se sentem impulsionados pelo Espírito para anunciar a boa nova. Afinal, como discípulos de Jesus Cristo o fazem a partir de sua prática e são desafiados a ver nos acontecimentos a presença do Espírito que fala através deles para que o Evangelho seja, de fato, uma realidade continuamente anunciada e sendo transmitida, na palavra e na prática, de forma adequada e por homens e mulheres que o fazem a partir de estruturas de serviço constituídas a partir das realidades conflitantes que “afetam profundamente” o mundo de hoje.
O grande problema, então, está em deixar o Espírito falar e não fazê-lo dizer o que queremos. O Espírito é desafiador, sempre no sentido da consecução do processo histórico em direção ao ômega. Não é e nem pode ser mantenedor de práticas que, se o foram construtoras do devir histórico eclesial, hoje representam a manutenção romântica das contingências construídas em outro momento histórico e social. O novo paradigma civilizacional que está em construção necessita do cristianismo, e isto o reconhecem pensadores não religiosos ou cristãos , e a Igreja deve ser um dos canais mais importantes dessa infusão.
Eis a grande responsabilidade e o grande desafio à Igreja neste século.
Lembremo-nos das palavras dos bispos brasileiros no documento “Missão e Ministérios dos Cristãos Leigos e Leigas”: “Na verdade – no tocante aos ministérios eclesiais –a Igreja, atenta às indicações do Espírito Santo, em função de suas necessidades internas e dos desafios da missão no mundo, vai se estruturando e organizando. [...] a Igreja, fiel a Cristo e guiada pelo Espírito Santo, não deveria ter medo de aceitar e criar novos modelos, satisfazendo assim às exigências de sua vida e missão nos diversificados contextos em que atua.” Qualquer estudo da Igreja na época pré-constantiniana, notadamente nos primeiros 150 anos, vê tal realidade. Aliás, num primeiro momento, antes do que se denominou depois de “a grande Igreja”, as diversas comunidades encontram propostas diferentes, no que diz respeito aos serviços e ministérios, aos problemas que se apresentam. Os estudos são tantos que podemos considerar o assunto como conhecido.
A Igreja vai se constituindo a partir das exigências da missão à qual foi impulsionada pelo Espírito em Pentecostes. E vai respondendo de formas nem sempre similares aos problemas que vão surgindo, tanto nas diferenças espaciais como culturais. A Igreja em Roma vai assumindo um rosto ministerial enquanto a Igreja em Antioquia assume outro. Sabemos que Paulo é enviado com Barnabé pelos presbíteros que estão à frente daquela Igreja (citar Atos e o livro em que isso é analisado). E isto sem dizer do imenso trabalho que têm os Padres da Igreja em seu diálogo com a cultura letrada da época e que influenciava o caldo cultural em que viviam os povos sob o Império Romano. Nada há de hebraico do credo niceno-constantinopolitano. É tudo grego! Afinal, qual a cultura dominante? Como falar da Encarnação sem responder aos questionamentos que o pensamento grego dominante fazia e que influenciava até o que podemos chamar de homem comum?
Mais que isso, é sensível para o que nos importa aqui o debate entre os de Tiago e os de Paulo. Imaginemos, apenas como método de pesquisa, se Pedro, mediando o embate de idéias desse a última palavra a Tiago e proibisse os de Paulo de continuarem o seu diálogo construído em praticas com os não judeus. Não seria de todo errado respondermos a essa pergunta imaginada com outra resposta também imaginada: a Igreja desapareceria como desapareceu a comunidade de Jerusalém depois das Guerras Judaicas, ou seria um grupo, uma diminuta seita de algumas dezenas de participantes.
Muito significativa é a parte dos Atos dos Apóstolos narrando o discurso de Pedro depois do Pentecostes : ele falava em aramaico e os que o ouviam o faziam em sua própria língua. Em verdade, a Palavra se encarna, sempre, no caldo cultural, do qual a língua é apenas um indicativo. E ao se encarnar, ela o faz com estruturas que digam algo para os homens e mulheres que são ou serão alcançados pela Boa Nova. Senão, eles e elas não entenderão aquela mensagem como boa nova.
2. Não calar o Espírito
Aparecida é corajosa em olhar a realidade da América Latina e do Caribe onde vê “uma realidade marcada por grandes mudanças que afetam profundamente” a sua vida. E afirmam sentirem-se desafiados “a discernir os sinais dos tempos” à luz do Espírito Santo” e o fazem como discípulos de Jesus Cristo. E estes são os pontos de partida de todos aqueles e aquelas que se sentem impulsionados pelo Espírito para anunciar a boa nova. Afinal, como discípulos de Jesus Cristo o fazem a partir de sua prática e são desafiados a ver nos acontecimentos a presença do Espírito que fala através deles para que o Evangelho seja, de fato, uma realidade continuamente anunciada e sendo transmitida, na palavra e na prática, de forma adequada e por homens e mulheres que o fazem a partir de estruturas de serviço constituídas a partir das realidades conflitantes que “afetam profundamente” o mundo de hoje.
O grande problema, então, está em deixar o Espírito falar e não fazê-lo dizer o que queremos. O Espírito é desafiador, sempre no sentido da consecução do processo histórico em direção ao ômega. Não é e nem pode ser mantenedor de práticas que, se o foram construtoras do devir histórico eclesial, hoje representam a manutenção romântica das contingências construídas em outro momento histórico e social. O novo paradigma civilizacional que está em construção necessita do cristianismo, e isto o reconhecem pensadores não religiosos ou cristãos , e a Igreja deve ser um dos canais mais importantes dessa infusão.
Eis a grande responsabilidade e o grande desafio à Igreja neste século.
Mas Aparecida ainda assume que “ a Igreja é chamada a repensar profundamente e a relançar com fidelidade e audácia sua missão nas novas circunstâncias latino-americanas e mundiais” . E nesta constatação, os bispos reunidos em Aparecida usam três palavras para expressarem o que essas novas circunstâncias exigem da Igreja: relançar, fidelidade e audácia.
Re-lançar deve nos lembrar o diálogo de Jesus com Pedro (...) muito bem usado por João Paulo II e sua “Tercio Milenio Adveniente” . Pedro é incitado a ir mais a fundo, a usar a mesma técnica, mas de forma diferente.
No caso da América Latina Santo Domingo já nos chamara a pensar seriamente numa evangelização inculturada como uma nova metodologia para a evangelização num continente que já tivera uma primeira aproximação com a Boa Nova de Jesus Cristo . Agora a Igreja tem que re-lançar, mas não no mesmo lugar, do mesmo modo, já que novas circunstâncias exigem novos métodos, novos sujeitos da ação. E também aqui há que se perguntar se de fato o humano da Igreja está disposto a re-lançar sua missão no sentido do qual estamos falando. Afinal, não é fácil se desinstalar do conhecido e ir mais a fundo.
Fidelidade é a absoluta necessidade no processo de evangelização, já que significa a manutenção da essência. Fidelidade não pode ser ao histórico, ao contingente, mas ao cerne que não muda e nem pode mudar, já que é a própria prática da Encarnação. E, infelizmente, a fidelidade pode ser um retorno às fontes, obscurecidas pelo histórico e contingente que assumiu-se como essência. Fidelidade é desfazer-se das mediações ontem necessárias e hoje entulhos e apropriar-se de novas mediações necessárias à transmissão da Boa Nova.
Por fim a mais difícil palavra de se aceitar no interno da Igreja: audácia. E para nos ajudar a entender o alcance e a necessidade da audácia vamos trazer, de novo, Aparecida, agora citando as palavras de Bento XVI quando ainda Cardeal Ratzinger: “nossa maior ameaça ´é o medíocre pragmatismo da vida cotidiana da Igreja, na qual, aparentemente, tudo procede com normalidade, mas na verdade a fé vai se desgastando e degenerando em mesquinhez´” . Em outras palavras, mantemos as mesmas estruturas espaciais e administrativas, as pastorais não buscam novas formas, e os ministérios e serviços continuam como há muitos séculos atrás. E por dois motivos: um porque é difícil mudar, ou seja, é difícil ter a audácia necessária frente ao novo; outro porque confundimos a essência pela contingência e, dessa forma, não conseguimos ter a audácia de romper com o histórico que só serve para as histórias do passado ou para o sonho romântico daquele que não quer perceber o mundo real que o rodeia.
Esta crítica de Bento XVI nos leva a um questionamento: nossa Igreja está estruturada para fazer frente a tais desafios? De nossa parte dizemos que não, tanto nas estruturas administrativo-pastorais como nas estruturas ministeriais.
Aparecida mostrou-se por demais consciente do problema. Por isso retoma o caráter missionário de toda a Igreja e dos cristãos. Aparecida reconhece que se estabeleceu um novo tempo no qual a mensagem da Palavra de Deus há que ser plantada em terra onde vicejam outras culturas e mesmo diversas “palavras de deus”.
Assim, há que se ter a coragem de se repensar no todo.
Ainda durante a primeira metade do século XX a maioria dos habitantes do nosso planeta vivia num mundo rural, não só como espaço construído e vivido, mas como visão de mundo, como estrutura básica da vida e da vivência. Até aí o urbano se constituía apenas como um espaço construído e em construção no qual os valores do rural deviam ser substituídos por aqueles que durante séculos foram se consolidando lentamente nos burgos e nas cidades européias. A cidade nada mais é do que o espaço dentro do qual os novos valores vão se moldando, ao mesmo tempo em que uma nova forma de prover o econômico tem com ela uma relação de causa e efeito: ela estrutura o novo modo de produção e também o serve como espaço construído. A cidade constrói teoricamente o capitalismo e é por ele continuamente reconstruída.
A Igreja nasceu e cresceu quando o mundo rural era absolutamente dominante, nesse universo rural real e simbólico, e construiu suas estruturas para responder aos seus apelos, seus valores, seu ritmo. Esse é um mundo masculino, patriarcal, sujeito à autoridade, lento, submisso necessariamente às forças da natureza que são, sempre, formas do relacionamento de Deus com os homens.
Mas a cidade, o burgo, venceu. Antes quistos incrustados no mundo rural, as cidades venceram, como o jovem Marx previra . A cidade, imagem do capital triunfante, engoliu o rural, tanto como local do habitar como através de sua visão de mundo. Desapareceram as estruturas e valores rurais, substituídos pelo urbano, no qual é decretada a morte do patriarcalismo e enaltecida a igualdade radical entre o homem e a mulher. Mais que isso, o urbano recoloca a autoridade em outros parâmetros, fazendo com que os antigos símbolos de autoridade mudassem do objetivo ao subjetivo, ou seja, ela não mais é introjetada de fora no homem como objeto, mas é o homem, na sua subjetividade, que escolhe a que autoridade se submeter.
Desaparece o mundo no qual “a pressa é inimiga da perfeição” e emerge o mundo no qual movimento, rapidez e eficácia se conjugam simultaneamente. A própria cidade é construída para que a circulação dos frutos do capital e do Homem a seu serviço se faça da forma mais rápida (Schorcke, Viena fin du siècle). E no dizer de Milton Santos, as forças técnico-científico-informacionais eliminaram os limites e barreiras da urbe, fazendo com que o espaço e o tempo sejam mensurados de outra forma.
Por fim, desaparece o repouso. As luzes não se apagam, a produção dos desejos-mercadorias não pára, o dia se perde na eternidade. Gozo permanente das sensações, o fruir do tempo prescinde dos vários eus que se confundem nos espaços, não se tendo mais tanta certeza do que é o real e do que é o virtual.
Eis o mundo urbano! Eis a seara que o cristianismo precisa transformar em messe.
Manter estruturas administrativo-pastorais e estruturas ministeriais como se nada houvesse mudado é assumir o histórico como eterno, ao mesmo tempo em que é negar os apelos do Espírito, ou seja, agir como se Ele nada mais tivesse a nos dizer.
Mas, além disso, onde estão os homens e as mulheres que precisam ser alcançados pela Palavra de Deus, na cidade? Em outras palavras, devemos reconhecer que o espaço construído, que chamamos de cidade, está cada vez mais segmentado em espaços de vivência nos quais a fé só pode se manifestar no particular, no pessoal. Na periferia, os símbolos religiosos lutam entre si por espaço. Já as classes médias se fecham em seus condomínios horizontais ou verticais (por vezes também habitados pelas classes populares, ressalvando-se sempre as peculiares diferenças). Se no primeiro caso a Igreja luta para ocupar espaço, no outro ela é proibida de se fazer presente como um sinal visível.
O mundo urbano gerou homens e mulheres que querem entender para decidir. Pelo lado da fé, esta só fará parte da vida do homem urbano se lhe disser algo com sentido para sua vida, sua história, sua existência. Os preceitos religiosos só serão vivenciados e cumpridos caso se mostrem plenos de significados.
O desaparecimento do mundo rural não eliminou do homem a necessidade de estar-com. Mas isto ele vai buscar viver num grupo no qual ele não é um número a mais ou um eterno desconhecido. Ao contrário, ele vai procurar comunidades que lhe são significativas, nas quais dialoga com semelhantes e nas quais também é reconhecido como uma unidade.
Aí está uma razão, entre outras, do surgimento das chamadas novas comunidades no campo católico. Por um lado refugiam-se no anonimato do mundo urbano e, por outro, realizam a necessidade de se manterem “plugados” na fé que desejam vivenciar. Afinal, têm fé, buscam o religioso, mas as estruturas espaciais e ministeriais que a Igreja lhes oferece, hoje, já não mais lhes dizem respeito.
Também os exemplos dos grupos de vivência em universidades, por exemplo, demonstram o mesmo. Todos conhecem tais exemplos nos quais professores e alunos se encontram regularmente para refletir a palavra e oficiar algum rito litúrgico, que pode ser a missa... Mas não freqüentam nossas matrizes paroquiais e nem nossas comunidades eclesiais, até porque naquelas são número sem rosto ou nome e nestas o nível de reflexão pode não responder aos seus anseios.
Aparecida simbolicamente abre as portas da Igreja, mas não para que os fiéis entrem. Ela sabe que a entrada na Igreja é uma expressão de um desejo do indivíduo ou da pessoa e não mais a manutenção de um costume. A pertença às instituições é uma opção pessoal. Por isso a porta da Igreja não é aberta para a entrada, mas para a saída dos fiéis, impulsionados à missão. Pelo menos a Igreja latino-americana e caribenha deve colocar-se em atitude de missão.
Mas, sair em missão não significa apenas mover-se em direção ao outro. Significa conhecer, em primeiro lugar, esse outro, sua estrutura de pensamento, seu ambiente vital. Faz-se necessário saber o que busca, que questões o seu coração abriga. Ir até ele sem ter isso em mente pode significar estar falando com um retrato do passado, mas que só serve como obra de arte.
Em segundo lugar não se pode pensar em um processo missionário se não olhamos de onde estamos partindo e para onde estamos chamando aqueles a quem encontrarmos em nosso caminho. Para entendermos esse questionamento basta dizer que nenhum discípulo se faz missionário se não experimenta a vivência em comunidade e, através de sua palavra e testemunho age no sentido de trazer o outro para tal convívio.
No mundo urbano como detalhado antes, fica claro que:
a) As estruturas administrativo-pastorais têm que ser totalmente reconstruídas;
b) Há a necessidade da constituição de novas formas ministeriais;
c) Há que se ter presente que a Igreja e a missão a ela entregue pelo Espírito (não é a Igreja que tem uma missão mas é a missão que tem uma Igreja) não são e nem podem ser responsabilidade de alguns. Pelo contrário, a corresponsabilidade eclesial deve ser o ponto de partida;
d) A vocação laical, pelas características que carrega, deve ser a ponta de lança nessa investida. Santo Domingo já o havia reconhecido;
e) Os ministérios confiados aos leigos e leigas devem ser colocados como uma das prioridades na reordenação eclesial que tem em vista a missão “no vasto mundo..”.
Pré condições
Mas os ministérios não ordenados só poderão alcançar o fim último a que se destinam caso sejam estruturados sobre algumas premissas básicas.
I. Os ministérios não ordenados devem ser exercidos por sujeitos eclesiais.
Os leigos e leigas que os exercerem não podem ser meros cumpridores de tarefas. As tarefas lhes vêm de fora como as tarefas que o patrão impõe aos empregados. Aliás, nem mesmo as empresas permitem que isso aconteça, já que é um dos princípios da administração empresarial contemporânea fazer dos empregados plenos colaboradores, sujeitos do processo de produção.
Os leigos e as leigas a quem são confiados os ministérios não ordenados não podem ser meras correias de transmissão. Isto não significa independência, separação. Ao contrário, como nos fala o Documento 62 da CNBB, a adequada relação entre os ministérios ordenados e aqueles confiados aos leigos e leigas...
Conceitualmente, o Sujeito sabe que é, e, por isso, sabe também o que não é. O sujeito laical, no exercício dos ministérios a ele confiados, faz com que as ações a serem executadas saiam de dentro de si, conforme sua vocação e o carisma em si derramado pelo Espírito.
II. Suplência: contradição essencial
Uma das deformações clássicas na formulação teórica dos ministérios confiados aos leigos e leigas é chamá-los de ministérios de suplência, como se os leigos e as leigas que os exercem o fazem porque não existem ordenados par exercê-lo. Isto é um erro teológico, pastoral, e fere a pura racionalidade.
Ao exercer um ministério que lhe foi confiado, o leigo ou a leiga não estão substituindo alguém em sua falta ou ausência. Afinal, o leigo e a leiga não podem substituir nenhum ministério ordenado. Em outras palavras, o leigo e a leiga não podem oferecer o sacrifício eucarístico, já que na atual estrutura ministerial, o ordenado o é exatamente para executar esse ministério, esse serviço absolutamente constitutivo e axial da vida de Igreja. O mesmo se diga do perdão sacramental. Afinal, seria inconcebível, a partir da atual estrutura ministerial, um leigo ou uma leiga serem chamados a ouvirem confissão e a perdoar os pecados. Esta reflexão nos mostra que não pode haver suplência em ministérios. Aqueles para os quais se exige a Ordem não podem ser confiados, e aqueles demais serviços podem ser exercidos como ministérios, desde que as pré-condições estejam estabelecidas, por ordenados ou não. Ninguém está suprindo a falta de ninguém. Como nos diz o Documento 62, todos os ministérios são carismas colocados a serviço da comunidade já que aqueles e aquelas que são chamados para tal são totalmente habilitados, pelo Espírito, para exercê-lo.
Dizer que existe a suplência é simplesmente dizer que os ministérios são, de fato, dos ordenados. Os outros são “empregos temporários” enquanto não se contrata os técnicos capazes para o serviço.
Os leigos e leigas exercem os ministérios a eles confiados mesmo que existam centenas de ordenados à disposição. E mais: há ministérios que devem (isso mesmo: devem!) ser confiados aos leigos e leigas, pois só eles e elas os podem exercer com eficiência e eficácia. O ministério da coordenação de uma comunidade, o ministério do acolhimento e da visitação, um possível ministério junto a determinados grupos profissionais, esses e muitos outros que a criatividade e o Espírito devem suscitar têm visivelmente o rosto laical.
Assim, os leigos e leigas exercem os ministérios a eles confiados por determinação do Espírito e não substituição temporária até que o titular assuma. Ao contrário,
são eles e elas os titulares.
III – Ministérios para um mundo urbano
O momento histórico que vivemos , em processo final de consolidação, de um único espaço vital que denominamos urbano, exige abertura ao novo.
Aí estão os novos homens e mulheres que prezam sua autonomia, que querem dizer a sua palavra, que têm um nome, que vivem a eterna velocidade, mas que buscam, mais que tudo, o sentido para suas vidas e sua existência. E esta última busca, diz a nossa fé que só o Cristianismo pode dar a resposta.
Este mundo e este Homem não são mais nada daqueles que conhecemos há 150 ou 200 anos. Como diz Brighenti, novas perguntas são formuladas por este novo mundo e este novo Homem e, portanto, a Igreja tem que ter uma imensa e corajosa criatividade, sempre antenada aos sinais do Espírito.
Aos atuais e conhecidos ministérios confiados aos leigos e leigas há que se interrogar a realidade e ter a coragem de criar o novo. Em primeiro lugar, lembremo-nos, novamente, de Aparecida. Não fujamos da responsabilidade da criação das “comunidades de comunidades”, das pequenas comunidades eclesiais, de todo tipo, que atendem aos novos sujeitos e suas preocupações existenciais, comunidades ambientais, locais, de bairros, de condomínios.
Não vale dizer que é difícil! Basta apenas repensar o papel de sujeito eclesial do laicato e, com ele, pensar os novos ministérios para esses novos areópagos, não no sentido de templos do saber, mas no sentido de templos do desafio, sentido que Paulo deu a seu tempo.
Exemplos existem para serem estudados. Afinal:
a) Um grupo de leigos e leigas que atendem e aconselham, em nome da comunidade e por ela indicado, não pode se constituir num ministério se assim a comunidade o entender?
b) Uma pastoral orgânica da saúde, braço da comunidade junto aos sofredores, sendo exercida em sua maior profundidade, organicidade e dedicação podem ser confiados como ministérios?
c) Uma nova família chega na área de abrangência da comunidade; uma mulher nessa mesma área é abandonada, junto com seus filhos, pela irresponsabilidade do homem; uma pessoa morreu no espaço da comunidade... Tudo isso não nos faz pensar em necessários ministérios confiados aos leigos e leigas?
d) Um condomínio fechado, horizontal ou vertical, ali onde o ministro ordenado não entra, mas onde os leigos e leigas moram, não é uma imensa messe? E quem vai ceifar? Com certeza, só pode ser um leigo ou uma leiga que, em nome da comunidade, vai ter a coragem de assumir o desafio.
e) E já que desafio pouco é perda de tempo, porque não entendermos o desafio que nos faz a internet? Você já tem o seu blog? Frequenta o Facebook ou o Tweeter? A que grupos você pertence na rede mundial de computadores? Se você respondeu negativo a todas essas perguntas, saiba que a juventude está toda ligada nisso, e agora os não tão jovens já começam a ter seus e-mails através dos quais o mundo lhes chega. Que tal pensar num ministério para esse mundo virtual?
FONTE: CARLOS FRANCISCO SIGNORELLI (EX-PRESIDENTE DO CNLB)
Nenhum comentário :
Postar um comentário