GRUPOS JUVENIS E O DESPERTAR DA CONSCIÊNCIA

A experiência associativa faz parte da formação humana e ganha maior importância na adolescência e juventude, acontecendo de diversas formas. Mesmo na contemporaneidade, com o avanço tecnológico, percebe-se, de uma maneira reconfigurada, a necessidade que temos do encontro com o outro.

Segundo a psicanalista Maria Rita Kehl, a adolescência é o período da formação de turmas, grupos, bandos, gangues, sendo estas ligações horizontais (fraternas, de sangue ou amizade) e de grande importância. A turma ajuda a passar das identificações infantis, de referenciais mais expressivamente familiares, e alcançar novos referenciais identificatórios(...)


Participar de um grupo

Os grupos juvenis configuram-se como espaços de criação cultural e tornam-se canais de ar ticulação de identidades coletivas. Duas características são essenciais para conceituar este tipo de associativismo: possuem alguma perspectiva coletiva e um determinado grau de formalidade e organização. Neste sentido, um fã-clube, uma banda de música ou um grupo de igreja são exemplos de grupos juvenis, pois, além de afinidades pessoais e/ou amizades, há um objetivo comum que os faz se encontrarem de maneira planejada.

Já no meio acadêmico, o conceito de tribalismo ganhou notoriedade a partir do sociólogo Michel Maffesoli. Embora o termo tenha se tornado corrente em veículos de comunicação e em pesquisas, é genericamente entendido como um determinado grupamento urbano característico (skatistas , punks ). Também tem outra dimensão conceitual, mesmo que muitas vezes todas essas definições se sobreponham. Participar de um grupo pode até ultrapassar barreiras territoriais, mas o sentido de pertença vai além de seguir o mesmo estilo e/ou filosofia.

Embora só 15% dos jovens brasileiros (segundo pesquisa do Projeto Juventude, publicada em 2004) participem de grupos jovens, podemos dizer que sua proliferação, principalmente em formatos menos institucionalizados e em ambientes mais populares, tem sido uma das marcas dessa geração. Por isso, precisam ser valorizados e reconhecidos como espaços educativos. Hoje, há uma infinidade de novas formas de participação juvenil e o desenvolvimento destes grupos mostra a disposição para contribuir com um mundo melhor, indo na contramão dos discursos generalistas de que o jovem é alienado ou desinteressado.

No entanto o grupo só será lugar de crescimento, amadurecimento e formação se permitir o conhecimento de si, a descoberta do valor do outro e o despertar para consciência coletiva. O grupo não pode ser um gueto . Seja em igreja, escola, ONG ou praça, deve entender que faz parte de um contexto e precisa estar aberto ao outro. Além de respeitar as diferenças e a diversidade dentro do contexto grupal, também é necessária a abertura para o diferente. A experiência de grupo saudável permite esse crescimento pessoal e coletivo, formando indivíduos que dialogam.

Uma ficção-realidade

Vamos falar aqui de um exemplo fictício e, ao mesmo tempo, concreto, baseado em muitas histórias reais: imagine uma banda de música de uma paróquia que, além de seus encontros de formação e ensaios, participa da reunião de coordenação dos grupos jovens da comunidade, troca experiências e decide ações conjuntas. O mesmo grupo conheceu outras bandas e decidiram, juntos, organizar conjuntamente uma rede, onde compartilham composições, estudam música, emprestam algum integrante quando necessário, organizam festivais etc.

Este grupo também conheceu outras bandas do bairro, que não são ligadas à igreja, e viu que também havia uma falta de espaço para eles, assim como falta de incentivos culturais a bandas juvenis do município. Fizeram um fórum, conheceram muitos outros... Quando os integrantes deram por si, já tinham uma ligação com aquele espaço criado e já lutavam conjuntamente pela melhoria do lazer, da educação e dos incentivos à cultura; já entendiam como funcionavam as instâncias governamentais e da sociedade civil. E nem por isso deixaram de ser uma banda de música da paróquia, que tocava nos encontros e em algumas missas. Tenho certeza de que não só a música em si, mas a vivência dessa relação de grupo (que amadurece), fizeram toda diferença na formação e na construção do projeto de vida desses jovens que por ele passaram.

Jakeline Lira,
pós-graduada em Cultura e Meios de Comunicação, PUC-SP/SEPAC. Assessora de comunicação da Inspetoria Salesiana do Nordeste, em Recife, PE.
Endereço eletrônico: jakeline_lira@yahoo.com.br
Blog: http://www.jakelinelira.wordpress.com/
Artigo publicado na edição 397, página 6.

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